Casa di Bebel ... Rabiscos sem papel

Casa di Bebel ... Rabiscos sem papel

17 setembro 2012

Aos montes

Ela sempre se vestia pra si mesma. Tinha três armários pra acomodar seu desejo de representar, de sinalizar para o mundo o que era. Não era à toa que amava figurinos. Não era à toa que tinha feito seus próprios figurinos em cada vivência artística. Não era à toa que estava escrevendo sobre figurinos e armários depois de ler o texto dele. Ele que era um escritor bem novo, novo em seus infinitos sentidos. Novo. Nova. Roupas novas, figurinos antigos. Traças. Troços. Tanto! Ela sempre se expunha sem muito sentido. Ela sempre se desnudava sem saber se a luz a protegeria da exposição. Ela sempre acumulava camadas sobre si. Sobreposição. Talvez por isso amasse o inverno. Amasse o cinza. A cor cinza permitia sobreposição. Uma roupa sobre a outra. Uma intenção pra fazer a composição. Tecidos pesavam sobre o seu pescoço depois da força imperiosa do tempo. A quinta vértebra passou a exigir que o Pilates ajudasse a retardar a introdução de um parafuso bem em cima da protuberância na parte de trás do pescoço. Nem lenço, nem pequenos colares de prata conseguiam ser sustentados por ela. Não gostava de se anunciar frágil. Talvez por isso insistisse em calças masculinas bem largas. Talvez por isso gostasse de botas um número maior pra poder sobrepor meias. Usava mais de três em dias de muito frio. Nos dias normais ... eram duas. Coisas que nunca pensou antes de ler. Antes de viver o que lê. O que lia. O que tinha acabado de viver. Sentia dificuldade de se desapegar de suas roupas. De seu mundo vívido dos figurinos. Auto-figurino. Tinha na lavanderia uma caixa grande de doações. Mas estava lá há mais de 4 meses. As despedidas sempre lhe doía. Os vestidos eram reduzidos. Nada de pernas de fora. Nada de decotes em V. Sua meninice estava nos pés coloridos. Nos anéis em muitos de seus dedos. Nos colares guardados nas caixinhas vindas do Peru ... ainda tinha esperança de sobrepor cada um deles pendurados em seu pescoço artificialmente alongado. Sua meninice estava nas pratarias que reluziam, por hora, em suas mãos. Sua adultice estava nas calças e suas coberturas. Nos coletes, talvez? Estava em si ... No passado rodeada só pelos meninos. No mundo lúdico dos meninos que sempre lhe caía tão bem. Sempre preferiu os meninos como companhia. Coisas de uma vida. ... Queria estar cada dia mais em si, queria se poupar dos desgastes e dos desbotamentos que as máquinas (de lavar) de lavar com vanish impõe. Compraria menos vanish de agora em diante. Economizaria R$ 22,00 por compra. Compraria mais meias. Vícios de uma vida inteira. Queria se desnudar menos. Auto-preservação. Em dias de mais de 30 graus em uma cidade marcada pelo frio ... percebeu que sentia falta dos dias de frio. Precisava do frio pra usar uma roupa por cima da outra. Sentiu saudade de um dos seus 20 casacos. Eram vinte? Vinteeeeee. E dentre eles ... um casaco roxo. Economizava-o. Ele era ... aquel amado! Aquele amado dentro de um armário cheio deles .... Só de casacos. Coisas de sempre ... Coisas de amor!

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