Casa di Bebel ... Rabiscos sem papel

Casa di Bebel ... Rabiscos sem papel

09 abril 2011

O esmalte preto

... Com um pouco de algodāo embebido em acetona popular tentava desesperadamente tirar aquela pretude dos pés. Havia pintado seus pés de um preto arroxeado pra combinar com aqueles dias de espera que ela bem conhecia. Os pés e as māos. Mas a cor das māos já havia anunciado seu fim em forma de lascas. As māos sempre iam primeiro.Tentava combinar a cor do esmalte com sua cor interna quase sempre em tons nada nude.
Naquele dia ensolarado percebeu uma certa reaçāo da manicure e algumas clientes à sua volta. Ainda nāo era inverno. Ainda nāo fazia frio. Nada combinava. Tudo permanecia. Pré-determinado pela força das sedimentadas convenções. E ela ... cansada dos 4 dias vividos sobre a égide do esmalte revolucionário merecia uns dias de descanso interno em meio ao novo século marcado pelo número de 2011. Enquanto sentiu o cheiro da acetona via o preto marcar o tapete do banheiro. Recolheu o algodāo tingido enquanto pensava no prometido fim do mundo que parecia estar agendado pra 2012. Em dias como aqueles ela chegava a acreditar na nova convençāo tāo banal quanto as das combinações dos salões de beleza. Do vermelho ao preto .... Em dias como aqueles em que o palco perdia seu status sagrado pra ser terreno do ego saltitante ela chegava a acreditar um tanto mais de que o fim do mundo estava mesmo sendo anunciado aos pouco em ritmo de conta-gotas. Afastou-se do cheiro da acetona.
Há uns dois dias atrás havia mais do que o esmalte e o palco da caixa preta pra se pensar. Havia uma cena jamais roteirizada .... Havia a escola. Havia crianças. Havia os andares. Havia a escada. Havia o medo. O desespero de quem sente e planta sua dor em meio as penas do travesserio. Havia gente ... De carne e osso e sangue. Havia uma vítima primeira. Havia especulaçōes jornalísticas que tudo sensacionaliza. Havia um crime ... Havia uma barbárie que sempre é primeiro ... Interna. Havia o caos de uma sociedade dita moderna, dita justa e igualitária. Havia ela vendo tudo de longe. Aguentou só uns 5 minutos. Viu a cena e quis desligar ... O aparelho. Interno. Levou dias pra se distanciar. Há tristeza coletiva e estava mergulhada dentro dela. Pensou na sua funçāo social. Culpou-se pelos tempos de antes. Mas a culpa em nada ajudaria. Assim como o Homem Piano resolveu esquecer. Pra lembrar depois com menos dor. Há um controle pra
dor.
Num dia como o de hoje .... Resolveu deixar pra lá. Saiu um pouco antes do fim. Aquela sensaçāo lhe aliviou. Estava mais consigo. Estava menos com eles e elas. Estava só. Aberta para o que poderia vir. No hall de entrava viu uns restos de escuridāo nos cantos de algumas unhas. Sombreadamente escuras. Sem disfarce deixou pra lá. Por lá.

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