Casa di Bebel ... Rabiscos sem papel

Casa di Bebel ... Rabiscos sem papel

24 novembro 2011

Ao passarinho que me fez voar

...desde o dia em que aquele mundo lhe foi apresentado ela esperava pela cena. O coração fazia cócegas desde o primeiro dia.
Havia de se ter coragem desde o primeiro dia, desde a primeira cortina vermelha. E ... Depois da segunda. O lugar, o cheiro, o chão, as caixas de som, o estado de voracidade que ela impria, a dança, os olhares. O ato de devorar!
Primeira vez, última vez? Qual o tamanho do passo, qual a medida da entrega, qual o tamanho do olhar. O por que das pequenezas femininas? O por que das escolhas insistentes?. O por que da reserva? O por que do convite? O por que do aceite? O por que do dedo impositivo.
Ela sabia fingir ... isso lhe haviam dito. Entendeu a indicação como um elogio, queria mesmo aprender a manipular a verdade no faz de conta que o teatro exige. Na grande mentira que há na comunicação de quem no centro do palco sente. E molda o que sente ao seu Bel-prazer!
Sabia que haveria um voo. E desde que aquele passarinho lhe foi apresentado há dois dias atrás pressentia sua marca dentro dela. Percebia o amor no seu super herói. Percebia seu Mestre em sua oferenda cotidiana. Percebia o encanto assim como percebia o descarte.
Dias de bailarina na ponta dos dedos das mãos. Dias de bailarina em suas dores corporais controladas. Dias de bailarina sem sapatilha mas cheia de vontade de rodopiar. Deixou-se levar pelo pequeno príncipe e seu mundo de princesas. Deixou-se levar pelo passarinho João de Barro que se ia aos poucos mais pra dentro. Espalhava suas asas dentro dela e ocupava um lugar. Abria espaços dentro dela. Colocou seu pouso apoiado em seus braços tortos. Apoios poéticos na última cortina. Ela foi e provocou um olhar úmido em meio a aridez.
Ainda que depois de tanto houvesse a provocação de quem no desepero se atira e se desvaloriza pela insitência desmedida ... ela bem sabia de si. Sabia que precisava se expôr mesmo fora de cena. E o fez ...
De manhã cedinho pressentiu a saudade, a desfalidez, a falta de cor que a despedida imprime na pele. No olho sem viço de quem sabe que se vai. Esvai
Enrolou o passarinho num guardanapo azul porque o azul lhe curava. E debaixo do pinheiro enterrou toda a mesquinhez daquele fim de noite.
Enterrou a sua mesquinhez também. Lembrou que o passarinho lhe fazia cócegas naquele instante em que o desapego exige uma primeira ação. Unhas sujas de terra. Tujú junto. Mais junto do que sempre. Demorou um certo tempo para as pinhas cobrirem o buraco. Uma flor rosa por cima. Umas lágrimas insistentes poderiam ter amolecido a aridez daqueles dias de sol. Raridades!
E foi ... Junto com ele. E ele ficou junto com ela. E ela levou eles para a terra do faz de conta que a caixa preta sugere.
E um dia triste passaria como todo passarinho passa sem saber se irá voltar!

Nenhum comentário: